PIONEIRO DE ÁGUAS CLARAS

PIONEIRO DE ÁGUAS CLARAS

 Por Tébis Oliveira,

ITM8_PesronaFotoFormado na turma de 1969 da UFMG, Juarez de Oliveira Rabello entrou na MBR (Minerações Brasileiras Reunidas) em 1970. Saiu e passou 3,5 anos trabalhando em outras mineradoras. Então voltou para a MBR e lá ficou por outros 34 anos, até janeiro de 2005, quando se aposentou. Os dois anos seguintes foram um “período sabático”, como ele os define. E quem pensou que o descanso, mais que merecido, faria Rabello abandonar a mineração, enganou-se redondamente. Ele está de volta ao mercado, agora com sua própria empresa – a J.Rabello Consultoria e Projetos, com sede em Nova Lima (MG).

Não é de se estranhar. Ouvindo o engenheiro de minas falar de desenvolvimento de projeto, operação de lavra, meio ambiente e da reintegração de áreas à sociedade, no que ele chama de “segundo ciclo econômico da mineração, que começa depois de exauridas as reservas de minério”, fica evidente seu entusiasmo pelo tema. Abrindo um sorriso, ele explica-se: “É o que fiz toda a minha vida. E me orgulho muito disso!”. Outro orgulho é ter participado da equipe da MBR que implantou Águas Claras nos anos 70. “Foi um projeto de grande porte muito próximo à região metropolitana de Belo Horizonte (MG). A MBR não apenas soube conduzir esse trabalho, fazendo uma mineração ambiental e socialmente responsável, como a transformou em modelo de empreendimento na região e para o setor”, assegura.

Esta entrevista à revista  In The Mine foi feita em nossa nova sede. Como as caixas da mu-dança ainda atravancavam a redação, recebemos Rabello no auditório do prédio. Ele estava em São Paulo (SP) para o aniversário de dois anos da mais nova de suas netas. Falou-nos bastante de Águas Claras, mas também de como a tecnologia não deve jamais afastar o gerente de sua equipe de produção, do quanto é necessário que as mineradoras abdiquem de vez da postura low profile e se comuniquem mais com a sociedade. E ainda de como faltam no mercado equipamentos, geólogos e técnicos qualificados: “Não falo apenas de jovens. Falo também dos mais experientes”, acrescentou. Com tanta espontaneidade e sinceridade, que não nos pareceu estar advogando em causa própria.

ITM: Como foi implantar Águas Claras?
Rabello: Pela proximidade da mina com a área urbana de Belo Horizonte, foi imperativo realizar toda uma interface com a comunidade. A mineração, não só no Brasil como no mundo, sempre teve um perfil low profile, no que a MBR não era diferente. No entanto, chegou o momento em que era preciso discutir abertamente com os diversos segmentos da sociedade, mostrando que não havia nada a esconder na atividade. Foram anos difíceis, mas também de muito aprendizado.

ITM8_PersonaPerfilITM: A situação se repetiria nos projetos de expansão e, depois, no final de Águas Claras, com Tamanduá.
Rabello: Sim. As reservas estavam próximas a Belo Horizonte, de áreas ocupadas por condomínios de classe média alta. Com Tamanduá (Complexo do Tamanduá, formado pelas minas de Tamanduá e Capitão do Mato, que substituiu Águas Claras em 2002), por exemplo, era preciso abrir dois grandes pits com um condomínio no meio. Foram anos de negociações in-tensas, sempre discutindo principalmente que o desenvolvimento do projeto em nenhuma hipótese poderia implicar na perda de qualidade de vida da comunidade local. Foi uma negociação de respeito mútuo e, hoje, a saída sul de Belo Horizonte, onde as operações se concentram, é a mais preservada do ponto de vista ambiental. Exatamente porque grande parte dessa área foi utilizada para mineração. A própria comunidade reconhece isso.

ITM: E, na época, não era apenas para atender exigências da legislação ambiental?
Rabello: No caso de Águas Claras, há mais de 30 anos atrás, não existia sequer legislação ambiental no Brasil. Os projetos da MBR já contemplavam essa questão, que era uma filosofia do grupo Caemi e de seu fundador, Augusto Trajano de Azevedo Antunes. Mesmo hoje, com leis específicas e a criação da Câmara de Meio Ambiente e Mineração, em Minas Gerais, o sistema de licenciamento é bastante democrático. Há o mito de que só grandes empresas fazem mineração responsável. Não é verdade. Já há muitas empresas de porte menor, organizadas, que estão plenamente conscientes de sua responsabilidade. Sem dúvida, há uma grande preocupação em interagir harmonicamente com a comunidade e o meio ambiente.

ITM: Essa consciência, inclusive, aproximou os planos de abertura e fecha-mento de minas, não é?
Rabello: A lavra a céu aberto sempre cria um grande impacto visual e o maior desafio da gestão da operação é entender que a questão ambiental não é isolada. Planejar a abertura e também o fechamento da mina tem que ser pensado desde o início, o que já se tornou um padrão nos projetos. Ninguém abre uma mina sem definir antes seu fechamento a longo prazo, em termos de destinação do estéril, barragem de rejeitos, etc. Tudo tem que estar contemplado no planejamento.

ITM: No entanto, não é essa a imagem pública da mineração…
Rabello: Grandes empresas de mineração preservam áreas enormes. Isso não evita uma imagem da atividade sempre atrelada à degradação ambiental, apesar do muito que se tem feito para mudar essa visão. A causa, repito, está na postura típica da mineração, de ser muito reservada. Um computador, por exemplo, contém pelo menos 20 tipos diferentes de minério, mas as pessoas desconhecem isso. É preciso que as empresas do setor trabalhem para tornar patente a importância da mineração, que cresce na medida em que mais tecnologias vão sendo incorporadas ao cotidiano do homem. Essa necessidade, de qualquer forma, não evita que o minerador exerça sua atividade com tal responsabilidade que, ao final dela, possa reintegrar a área à sociedade.

ITM: A legislação brasileira contempla essas exigências? Há quem diga até que ela é rigorosa demais.
Rabello: A legislação brasileira é suficiente. O grande problema, e não apenas na mineração, é o licenciamento dos projetos pela morosidade dos órgãos do sistema ambiental. Esse assunto deveria ser tratado com um mínimo de celeridade, dada a importância da mineração para o País, agora cada vez mais clara com a elevação do preço das commodities, principal-mente do minério de ferro. Não é possível mais esperar anos para obter uma licença. Tem que haver mais objetividade. Por outro lado, o empreendedor tem que ter a preocupação de apresentar um projeto bem elaborado. Deve fazer seu dever de casa bem feito, contemplando todas as questões envolvidas. Um projeto de mineração que não esteja interagindo devidamente com o exterior terá problemas. Na maioria das vezes, conseguirá apenas ser um alvo preferencial de críticas.

ITM: Na opinião do senhor, em que a mineração evoluiu nos últimos anos?
Rabello: As principais empresas já possuem processos de gestão implantados. Há alguns anos não havia uma normatização tão significativa. Isso começou na última década, com a aplicação da norma ISO 9000, cujo objetivo era justamente o de estabelecer padrões. O mesmo ocorre com a área ambiental a partir da ISO 14000 e com a OHSAS 18000, de segurança e saúde ocupacional. Para atender essa normatização, as empresas têm investido em tecnologia. No entanto, é preciso que toda essa tecnologia não afaste o gerente do campo de operação, de sua equipe de produção. O planejador não pode ser a figura à frente da tela de um computador, que é o que se tem visto cada vez mais.

ITM: Para o senhor, de que a mineração se ressente hoje?
Rabello: Faltam equipamentos, faltam geólogos e faltam técnicos. E não falo apenas de jovens. Falo também dos mais experientes.

ITM8_PersonaGrandeITM: Houve mudança no conceito de lavra?
Rabello: Sim. O crescimento econômico demanda mais e mais o crescimento da mineração. O caso da China, nos últimos anos, é sintomático dessa demanda. Só a CVRD exportou 75 Mt de minério de ferro para a China. Lá, as siderúrgicas crescem um Brasil por ano, o que faz com que os planos de expansão das minas se sucedam, inclusive passando a considerar reservas que antes não tinham aproveitamento econômico. Hoje, no Brasil, as maiores re-servas de hematita estão em Carajás e grande volume da lavra de minério de ferro no País se faz de itabiritos, que era inaproveitável há alguns anos. Assim, cada vez os teores de minérios são menores e a lavra precisa ser feita com equipamentos cada vez maiores para reduzir o custo operacional. Essa é uma tendência mundial.

ITM: O movimento de demanda crescente também tem refletido no aumento da pesquisa mineral.
Rabello: O boom da mineração sempre traz oportunidades. Nunca se fez tanta sondagem rotativa como atualmente. O mundo entendeu que o desenvolvimento mineral precisa ser acelerado e que é preciso investir em mineração. E sem pesquisa não há descoberta. Quem poderia imaginar desenvolver um projeto de minério de ferro que não fosse no Quadrilátero Ferrífero ou em Carajás? No entanto, hoje temos operações em Goiás. Isso nos conduz a outro problema: há minério, mas não há logística para escoar a produção. Em Goiás, o transporte é feito por barcaças num percurso de mais de 1,2 mil km. Sem logística, não existe minério economicamente viável. Para o minério de ferro, por exemplo, estratégico para o País, só há três corredores ferroviários – a MRS, EFVM e a EFC. Fora a carência por portos e outros sistemas de transporte. Isso nos leva a um lado bom do minério pobre que é o de viabilizar minerodutos.

(Março/abril 2007)

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